04 novembro 2006

Agora sou uma cidadã!

Outro dia recebi uma ligação de um jornalista da TV Justiça, me convidando para participar com minha avó de uma matéria sobre o voto feminino. Eles tinham a intenção de mostrar as gerações da família exercendo o direito ao voto e inclusive já havia até conversado com ela e agendado a entrevista.

Oras, é claro que eu não recusei participar, já havia estado diante das câmeras de TV em outras oportunidades falando ao vivo sobre sexualidade, gravar uma matéria sobre voto seria muito mais tranqüilo, ainda mais com minha avó.

Tentei fazer com que minha mãe fosse, mas ela não pôde ir, então levei minha tia, que poderia ajudar minha avó a recordar sua vivência com as eleições.

Bem, minha avó nasceu em 1915, morava em fazenda e só veio tirar seu primeiro título de eleitor já casada, morando na cidade. Naquela época, aliás, as mulheres não participavam tanto de conversa sobre política, mas ela já sabia que tinha direito ao seu título eleitoral e, como contou à repórter: “Quando votei pela primeira vez me senti muito feliz. Agora sou uma cidadã!”.

Minha tia, ainda criança quando minha avó votou pela primeira vez falou muito bem, principalmente sobre as mulheres se engajando na vida política e conquistando mais espaço.

Veja bem como as coisas aconteceram em nosso país: a conquista absoluta do voto feminino no Brasil ocorreu, em 1932, durante o processo histórico desencadeado pela Revolução de 1930. Mas antes disso as mulheres já batalhavam pelo direito de voto, buscavam a afirmação da cidadania das mulheres, a conquista da igualdade de salários, oportunidades e outros direitos. Elas batalharam por esse direito que só foi concedido pelo então presidente Getúlio Vargas que promulgou o Código Eleitoral dando direito de voto a toda brasileira maior de idade.

No final de 1937, após o golpe militar, Getúlio Vargas instituiu o Estado Novo, uma ditadura que se prolongou até 1945. Durante oito anos, as eleições ficaram suspensas, e o Brasil vivenciou o período marcado pelo centralismo político.

Em dezembro de 1945, o general Dutra foi eleito e esta foi a primeira eleição que minha avó participou. Foi legal ouvi-la contando que foram utilizadas cédulas eleitorais impressas com o nome de apenas um candidato, que eram distribuídas pelos próprios partidos. A cédula oficial só foi utilizada pela primeira vez nas eleições de 1955. Aí nos anos de 1956 e 57 ocorreu um novo recadastramento eleitoral.

Em 1964, os militares aplicaram o Golpe de Estado que tirou o presidente João Goulart (o Jango) do poder e deu início a uma longa ditadura que durou 21 anos. Podemos afirmar que foram longos e cinzentos anos.

Bem, eu nasci em 1968, quando a fase da ditadura brasileira foi considerada a mais dura do regime, compreendida até 1974. Nesta época, milhares de pessoas foram presas por se oporem ao regime, e outras centenas foram exiladas, ou seja, tiveram de sair do país. Veio o movimento pela anistia.

Em 1983, um deputado apresentou uma emenda constitucional que propunha, para o ano de 1984, eleições diretas para a Presidência da República. Esse movimento ficou conhecido como Diretas Já! Aconteceu um novo recadastramento eleitoral em 1986, com informatização do cadastro de eleitores.

Tirei meu titulo de eleitor em 1988 e a primeira eleição que participei foi em 1989. De lá pra cá, venho sempre exercendo meu direito e participado das eleições, plebiscito e referendo.

Minha tia começou a votar na mesma época que eu, e minha avó, mesmo já liberada pela idade atual, ela continua votando. Como ela disse, sorrindo e com os seus lindos olhos verdes brilhando: “Ainda voto sim, ainda sou gente! Ainda sou uma cidadã”.

O melhor de toda esta experiência que tive foi notar que participarmos e exercermos um direito conquistado. E também por perceber que nós mulheres continuamos a conquistar muitos outros direitos e cada vez mais espaço no mercado profissional, na política, na sociedade. Sinto orgulho por ver minha avó, com tão pouca instrução, vivenciando tudo isso.

Além de ter sido muito bom viver esta experiência da entrevista com três gerações da família. Gravei a matéria, vamos poder assistir na primeira oportunidade e rever sempre que quisermos.

Autógrafos? É claro que você vai querer das três, não é mesmo? rs...